Estima-se que cerca de 15% das pessoas nas grandes cidades tenham insônia. Isso significa que em uma cidade como São Paulo, quase 2 milhões de pessoas tenham esse distúrbio. Quando consideramos algo mais abrangente, como a frequência de queixas gerais ou reclamações sobre o sono (como dificuldade de dormir ou sonolência diurna), isso pode subir para 70%! Com tantas pessoas dormindo mal, é natural que muitos busquem por algo que as faça dormir melhor.
Entre as diversas técnicas possíveis para tratamento de insônia (como a terapia cognitiva-comportamental e técnicas complementares com a meditação e o mindfulness), muitas das pessoas acabam recorrendo às medicações para dormir (também conhecidos como hipnóticos). Parece existir uma busca por uma pílula mágica que nos faça dormir bem à noite e acordar dispostos na manhã seguinte.
Será que essas medicações para dormir realmente funcionam? Neste blog vamos discutir os usos e os perigos das medicações hipnóticas.
Medicações disponíveis para dormir
A indústria farmacêutica tem investido muito em medicações para dormir, justamente por saberem que o mercado de pessoas querendo comprar algo que as faça ter uma boa noite de sono é enorme.
Desde a década de 70, novas medicações têm sido desenvolvidas especificamente para o tratamento da insônia (como os benzodiazepínicos e o zolpidem). Atualmente vivemos uma revolução nessa área e estamos entrando na 4ª geração das medicações indutoras de sono.
Essas medicações são específicas para a indução do sono e já estão disponíveis há algum tempo (o que não significa que não tenham efeitos colaterais – como discutiremos a seguir). Ainda assim, muitas pessoas ainda usam outras medicações, como os calmantes, antidepressivos e até alguns antialérgicos.
Muitas vezes o uso desses remédios é fruto da auto-medicação. Isso é um grande risco, pois ao se auto-medicar não temos controle preciso de dose e dos efeitos. Além disso, algumas pessoas recorrem até mesmo ao álcool como alternativa para tentar dormir.
Os remédios para dormir realmente funcionam?
Depende do que você chama de dormir...
Se você estiver simplesmente falando do tempo que passa na cama, a resposta é “sim”. A maior parte dessas medicações realmente vai nos fazer dormir por um tempo maior. Porém, temos que entender que “dormir mais” é algo completamente diferente de “dormir melhor”. O tempo não é necessariamente um bom indicativo de uma boa qualidade de sono. Na verdade, um tempo deitado muito aumentado é muitas vezes um indicativo de que ele não está ocorrendo de modo adequado.
Essas medicações para dormir agem no nosso cérebro, alterando os neurotransmissores que regulam o nosso ciclo circadiano. Com isso, elas acabam alterando muito a arquitetura do nosso sono.
Você deve se lembrar de que o sono é composto por diversos estágios. Uma noite de qualidade depende de uma organização bem refinada da sequência e da proporção de cada um destes estágios. Para nos fazer dormir mais, os remédios hipnóticos bagunçam completamente a harmonia entre os estágios do sono.
Para nos fazerem dormir mais, esses remédios levam a um aumento muito grande no tempo de sono de ondas lentas (também chamado estágio N3). Como este é o estágio mais profundo, aumentá-lo significa que estamos quase sedados ao usar essas medicações. Em contrapartida, o sono REM (muito importante para o funcionamento adequado do nosso cérebro) é muito diminuído. Essa desproporção entre estágio N3 e REM é um dos grandes efeitos negativos das medicações para dormir. Note que ao alterar o balanço desses estágios, as medicações para dormir induzem um sono completamente artificial.
Além do prejuízo ao equilíbrio desses estágios, muitos outros problemas podem ocorrer com o uso destas medicações:
Efeitos colaterais das medicações para dormir:
Sonolência residual: Este é o nome técnico para quando acordamos baqueados e com sono, após uma noite em que tomamos uma medicação para dormir. Isso acontece principalmente quando a medicação não está ajustada (seja no tipo de medicamento ou na dose). Nesse caso, quando acordarmos ainda estamos sob efeito do remédio que foi tomado na noite anterior.
Prejuízos cognitivos e problemas de memória: Lembre-se que o sono REM é essencial para que a nossa memória funcione bem. Como essas medicações diminuem muito o REM, elas acabam por afetar muito a memória.
Dificuldades de concentração e déficit de atenção: Pelo mesmo motivo anterior, o uso dessas medicações podem nos fazer ter dificuldade de concentrar e manter a atenção. Por conta disso, pessoas com insônia ou privadas de sono também podem ter dificuldades de aprendizado.
Letargia, apatia, confusão mental e falta de coordenação: Lembra que dissemos que os remédios para dormir aumentam o tempo de sono de ondas lentas? Esse estágio chama-se assim justamente por que nosso cérebro está trabalhando com a menor velocidade possível. Isso realmente é importante durante a noite, mas certamente não é algo que queiramos durante o dia. Dependendo da dose, as pessoas que tomam medicações para dormir podem ainda ficar sob o efeito desses remédios mesmo durante o dia. Nesse caso, o cérebro funciona de modo mais lento, causando todos esses efeitos.
Tolerância: Sempre quando tomamos um remédio de uso contínuo, é possível que com o tempo ele deixe de fazer efeito. A isso se dá o nome de tolerância. A única maneira de driblar a tolerância é aumentar a dose. Porém, em medicamentos como os indutores de sono, aumentar muito a dose posse ser bem perigoso e aumenta muito a chance de efeitos colaterais.
Dependência: Muitos desses remédios podem causar dependência física e mental. No caso da dependência mental (chamada de “condicionamento”) a pessoa não se sente mais capaz de dormir sem o medicamento. No final das contas o remédio não faz mais efeito (como falamos acima, no item “tolerância”), mas mesmo assim não conseguimos deixá-lo.
Interações medicamentosas: Os medicamentos para dormir apresentam muitas interações medicamentosas. As principais delas são com outras drogas que também fazem com que o cérebro desacelere. Alguns exemplos são calmantes, medicamentos para dor e barbitúricos. Portanto, nunca tome um desses remédios por conta própria. Mesmo que a medicação para dormir tenha sido prescrita pelo seu médico, avise-o de outras medicações que você já toma, para que ele avalie se é seguro usá-la. Outra interação medicamentosa muito importante dos remédios para dormir é com o álcool. Jamais beba e tome medicação para dormir! Os riscos são grandes...
Risco de acidentes: Se você já leu a bula de um desses medicamentos, deve ter visto que não se recomenda “dirigir ou operar máquinas pesadas” após tomá-los. Realmente, os hipnóticos podem causar tanto acidentes automobilísticos quanto de trabalho. Para entender o motivo do risco aumentado para acidentes, basta que juntemos dois dos efeitos colaterais que já mencionamos acima: sonolência residual e déficit de atenção.
Quedas e fraturas: Em idosos que tomam esses remédios há um tipo de acidente adicional: o risco de quedas. Quedas e fraturas são muito perigosas em idosos, pois diminuem muito a funcionalidade e a qualidade de vida. Deve-se ter muito cuidado com as medicações para dormir na terceira idade!
Aumento do ronco e piora da apneia: Por conta do relaxamento da musculatura relacionada à respiração, esses quadros podem piorar bastante em quem toma medicação para dormir.
Qual a lógica por trás das medicações para dormir?
Por tudo que já mostramos acima, fica bem claro que existem muitos riscos e efeitos colaterais associados às medicações hipnóticas. Porém, isso não significa que eles não sejam úteis. Na verdade, em alguns casos eles podem ser bem importantes, desde que usados da maneira correta. Para entender quando as medicações para dormir são úteis, é preciso entender um pouco de como se dá o tratamento da insônia.
A primeira coisa importante é entender que o sono não deveria ser induzido, mas deve ser permitido O sono deve ocorrer naturalmente. É claro que isso é muito difícil para alguém que tenha insônia. Ao invés de induzi-lo, temos que buscar identificar o que causa a insônia e tratá-la.
O tratamento mais adequado não é aquele que induz o sono artificialmente, mas aquele que identifica as causas da insônia e foca nessas causas, permitindo que o sono ocorra. Em outras palavras, o tratamento da insônia deveria tirar do caminho todos os obstáculos que impedem que você tenha um sono de qualidade.
Existem muitas causas possíveis para a insônia – como já discutimos nesse blog. Geralmente temos um fator precipitante (um gatilho para os sintomas de insônia) e um fator perpetuante (algo que a torne crônica).
Os gatilhos geralmente são algum estresse. São exemplos: problemas conjugais e familiares, problemas financeiros, excesso de trabalho, desemprego, luto, etc. Doenças psiquiátricas também podem iniciar a insônia (como a ansiedade ou a depressão) ou condições orgânicas (como dor e a menopausa). Todas essas condições fazem qualquer pessoa passar uma noite em claro. Já os fatores perpetuantes geralmente são comportamentos, hábitos e crenças que fazem com que as dificuldades de sono continuem, mesmo que o estresse inicial já tenha passado. Em muitos casos, funciona como se nós desaprendêssemos a dormir. Além disso, doenças também podem torna-la crônica. São exemplos a ansiedade, a depressão e doenças crônicas que causam dor (como fibromialgia e artrite reumatoide).
As vezes não é fácil identificar o fator desencadeador da insônia. Depois, também não é fácil identificar os comportamentos que atrapalham o sono. Por fim, não é fácil tratar as causas. Esses passos relacionados a entender e tratar as causas das noites mal dormidas podem levar meses. E é justamente nesse momento que os remédios para dormir podem ajudar.
Os remédios podem nos ajudar a dormir, enquanto ainda não conseguimos descobrir as causas da insônia e modificá-las. Porém note: os remédios para dormir deveriam ser um tratamento provisório, enquanto os reais desencadeadores da sua insônia estão sendo identificados.
Tratamento adequado da insônia
Por conta disso, as medicações para insônia são pensadas para serem usadas por não mais do que 3 meses consecutivos. É esse o período que temos para descobrir a causa por trás da insônia.
É também por isso que o principal tratamento atual para a insônia, reconhecida por todas as sociedades de medicina do sono mundo afora, não são os remédios, mas a Terapia Cognitivo-Comportamental para Insônia . Essa terapia é feita justamente com o objetivo de identificar causas, comportamentos e crenças relacionadas à dificuldade de dormir. Além disso, algumas técnicas complementares (como meditação e mindfulness) também podem ajudar. A SleepUp pode te ajudar muito nisso!
Infelizmente, na prática as coisas ocorrem de modo muito diferente... Muitas vezes as pessoas são tratadas indiscriminadamente com medicamentos para dormir, sem qualquer comprometimento de se buscar as causas dos problemas relacionados ao sono. Isso apenas leva à cronificação da insônia, perpetuação do uso das medicações e predispões a todos aqueles efeitos colaterais que já mencionamos acima.
O que fazer?
Com tantas informações, é natural que fiquemos um pouco perdidos sobre o que fazer para tratar as queixas de insônia. As perguntas abaixo podem nos direcionar.
1. Posso tomar remédios para dormir por conta própria?
Nunca! Acima nós listamos vários efeitos colaterais dos medicamentos para dormir. Ao tomar algum medicamento por conta própria, você corre grande risco de errar na dose, na via de administração ou na escolha do remédio. Tudo isso aumenta o seu risco. Lembre-se: as medicações que funcionam para outras pessoas não necessariamente funcionarão para você.
2. Qual o melhor remédio para a minha insônia?
Existem muitos tipos de insônia e diferentes remédios podem auxiliar em cada caso. A escolha do medicamento correto depende de uma consulta com um especialista e, às vezes, de alguns exames.
3. Posso parar de tomar meu remédio?
Nunca pare de tomar um remédio sem o consentimento do seu médico! Assim como o início do uso de um remédio deve ser acompanhado, a retirada também deve. Parar de tomar um remédio abruptamente pode trazer muitos problemas. Se você sente que pode manejar sua insônia sem medicação, converse com seu médico e estabeleçam um plano para isso. Em qualquer caso, a terapia cognitivo-comportamental pode facilitar o processo de retirada das medicações para dormir.
4. Para quem posso pedir ajuda?
Para tratamento com medicamentos, apenas os médicos são habilitados a lhe ajudar. Nesse caso, ressaltamos a importância de que você procure um médico com habilitação ou treinamento em medicina do sono (idealmente certificado pela Associação Brasileira de Sono). Para tratamento não-farmacológico, você pode procurar por psicólogos especializados em psicologia do sono. Estes profissionais são os mais habilitados para a aplicação da terapia cognitivo-comportamental.
5. Posso fazer outras terapias para insônia, além da medicação?
Deve! Em qualquer tipo de insônia, os tratamentos complementares podem lhe ajudar muito. No caso de pessoas que utilizam medicação para dormir, essas terapias podem lhe ajudar a deixar a medicação com mais facilidade. A terapia mais reconhecida para tratamento da insônia é a Terapia Cognitivo-Comportamental.
Esperamos que você tenha entendido o papel, os potenciais benefício e os riscos do uso dos remédios para dormir. Em qualquer caso, com ou sem remédios, a SleepUp pode lhe ajudar a ter noites melhores de sono. Acompanhe nossas redes sociais e fique atento aos nossos lançamentos!
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